sábado, 7 de junho de 2014

Para reflexão

Texto escrito pela mãe Vanessa Anacleto, postado por ela no Facebook (reproduzido aqui com sua autorização) 

(Foto: Alexandro Auler / Parceiro / Agência O Globo)


A foto acima foi tirada ontem no Rio de Janeiro e mostra um professor apanhando de policiais. O fato é comum e vergonhoso. Na Terra de Vera Cruz, o vocábulo Educação costuma ser bastante explorado e pouco praticado. Em Vera Cruz a educação foi utilizada somente como modo de dominação ideológica logo após o nascimento e muito pouco mudou desde a pedagogia Inaciana. Um belo dia , quando não mais foi conveniente ao dominador que se educasse religiosamente, passamos a ser educados de modo algum. Esperamos sem escola , na mais profunda ignorância, durante anos até que a reforma educacional em Portugal ficasse pronta e ai, quem sabe, a matriz se ocupasse da nossa existência. Quem se ocupou? Ninguém. Enquanto isso, proibiram os padres e sonegaram os laicos. 

Depois dos padres, depois dos longos anos sem escolas, alguém se lembrou que os - muitos - pobres de Santa Cruz precisavam deixar de esmolar pelas ruas e abarrotar as cadeias. Empenho em promover educação libertadora? Nada disso. Bastava aprender um ofício. A aquisição da capacidade de pensamento crítico que possibilite autodeterminação fica restrito à classe dominante, que semelhante às castas indianas - e por muito pouco podem me acusar de exagero - permanece no poder há 5 séculos. 

E nesses séculos de escuridão , a Terra de Santa Cruz teve alguns poucos dias de sol que trouxeram figuras como Anísio Teixeira, Darcy Ribeiro e um punhado de poucos loucos geniais e teimosos que ousavam pensar políticas educacionais democráticas. Foi um sopro de vento fresco e breve. Logo veio a ditadura travestida de revolução fechando livros e calando vozes. Como não se educa sem liberdade, não se educou. Só se instruiu, se adestrou. 

Como tudo o que sobe, tem que descer, veio a era da redemocratização - se é que é possível refazer algo que na prática nunca existiu- e encontrou um país versado em Moral e Cívica, analfabeto das letras e de si. .Quando os coturnos nos deixaram com 31.9% de taxa de analfabetismo ( fonte: IBGE) , na impossibilidade ( ou falta de vontade?) de alfabetizar e letrar a todos , garantindo-lhes a leitura do mundo, concederam direito ao voto àquele que não sabe ler nem escrever. Para manter tudo como está , basta carimbar o dedo. Chamam a isto Democracia, outro vocábulo com problemas de utilização, mas esta é outra história. O tempo foi passando com reformas de tempos em tempos,, sem nada que significasse verdadeiramente uma mudança na política educacional.

Agora, quando “nunca na história deste país” chamado Brasil tantas coisas caminharam para cima e para baixo, a injustiça educacional persiste. Professores são desvalorizados ( para que valorizar quem pode ajudar a tirar as vendas dos olhos dos outros? Cortemo-lhes as mãos!) , Temos treze milhões de analfabetos adultos, trinta e três milhões de analfabetos funcionais , nos envergonhamos com a liderança dos rankings de ineficiência educacional, sofremos com greves e descaso. Parece um buraco sem saída, onde quanto mais se cava, mais se vai ao fundo.

Queremos um país com índices educacionais decentes, erradicação do analfabetismo e evasão escolar. Queremos que todos sejam capazes de operações simples como preencher um formulário, ler um parágrafo com compreensão plena, assistir ao telejornal e discernir a notícia do interesse do anunciante, do governo ou da oposição. Queremos mais que bons resultados em testes com siglas diversas, queremos um povo apto a pensar, conhecer, reconhecer e modificar sua realidade. Queremos tantas coisas e tudo o que temos é uma greve atrás da outra.

Como se muda um quadro como este? É como descobrir a saída de um intrincado labirinto habitado por um monstro que o conhece de cor. Os professores fazem greves a cada ano, lutando pelas mudanças necessárias na educação. A greve para a produção do professor que, ao contrário de todas as demais categorias, não é produção de bem de consumo, mas todo um processo de construção de conhecimento que poderá resultar na saída do labirinto já na próxima geração. Greve de professor é justa, mas não tem sido eficaz. Vivemos em uma sociedade onde policial bate em professor com muito mais valentia do que corre atrás de bandido. O que muda o estado de coisas é a implementação de políticas públicas de cima para baixo. Como sabemos que de cima ela não virá de bom grado, precisamos ir lá buscá-la. Como buscamos? Juntando forças . Abraçando a causa. Parar a produção da aquisição do pensamento crítico não tem sido solução. 

A luta da educação não é só do professor, interessado natural em criar bases sólidas para o exercício de sua função. A luta da educação é de cada um de nós, tenha ou não filho em escola pública, tenha ou não filho e deveria nos mover sempre e não só quando a corda ameaça a roer. Se olharmos bem ela já está roída, foi nos entregue roída e já está por arrebentar. Por isso sou contra a greve dos professores. Não é que lhes falte direito, nem lhes falte pelo que lutar, o que está faltando é estratégia. Estamos andando em círculos dentro do labirinto e o monstro está pronto para jantar.

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